O Tempo do Consumidor O Tempo do Consumidor Luís Queirós, Chairman do Grupo Marktest, reflete sobre a história do consumidor desde a antiguidade e lança questões para o futuro. Grupo Marktest 2 abril 2013
Luís Queirós, Chairman do Grupo Marktest Luís Queirós esteve presente nesta Conferência, realizada no âmbito do II Ciclo de Conferências da Comunicação, a convite da professora Dra. Luísa Magalhães. O comércio na antiguidade A época em que vivemos poderá ficar conhecida para os vindouros como a Era do Consumidor, para referenciar a entidade que desempenha o papel central em toda a atividade económica. Comprar, vender e trocar são as atividades que animam o dia-a-dia dos indivíduos e das empresas. O comércio moldou o mundo tal como ele existe hoje. Esteve na origem de guerras e de conquistas, influenciou a literatura e as artes, promoveu viagens, ajudou a desenvolver os meios de transporte, fez e desfez fronteiras. É responsável pela globalização e, hoje, confunde-se muitas vezes com a própria economia. Foi há cerca de 10,000 anos que a sedentarização dos caçadores-recolectores, ocorrida no Crescente Fértil em consequência da domesticação de animais e plantas, levou à criação de excedentes, os quais, ao permitir alimentar mais pessoas do que aquelas que produziam os alimentos, estiveram na base da diferenciação social. As trocas, a partir daí, tiveram um papel preponderante na vida das novas comunidades que se fixavam em redor das terras de cultivo. O sal terá sido o primeiro produto comercial a ser transacionado. Só estava disponível nos jazigos de sal-gema ou junto ao mar, mas era necessário para as funções vitais e para a conservação dos alimentos. Nasceram as primeiras vias comerciais: as rotas do sal. No império Romano o comércio teve um grande desenvolvimento. A metalurgia do bronze e do ferro para o fabrico de armas e artefactos e a necessidade de ouro para cunhar moedas levou os Romanos a procurar e explorar por todo o império jazidas minerais. A urbanização tornou necessário atrair ao centro do Império vastas quantidades de alimentos que fluíam pelas rotas marítimas e terrestres. A cerâmica era necessária para fabricar embalagens de transporte e armazenamento. Do médio oriente vinha as tintas, o incenso e a mirra. Mas o comércio mais ativo seria o dos escravos, a principal forma de energia em que assentava a economia do império. O comércio floresceu nos burgos medievais que cresceram após o feudalismo. Na Europa central, o comércio organizou-se, a partir de Lubeck, nas cidades do Báltico que se uniram na Liga Hanseática, uma espécie de zona de mercado livre com regras próprias. Os artesãos produziam objetos de cerâmica, teciam e trabalhavam o ferro, o couro, a pedra e a madeira. No arranque do segundo milénio, a utilização da charrua de ferro aumentou a produtividade agrícola. E os excedentes assim criados e o fervor religioso fizeram dos dois séculos seguintes o tempo das catedrais. E foi à sombra dessas catedrais que se aprimorou o trabalho dos artesãos. As guildas, as corporações de ofícios, impunham regras de qualidade e de preço aos produtos. Parece-me ver aqui o embrião da iniciativa privada que esteve na base da empresa moderna. O vínculo entre o produtor (o artesão) e o cliente já contém as bases de uma relação que importava manter e consolidar. Já contavam a imagem e o prestígio do produtor, já estava esboçado o conceito de marca. A "origem" funciona como certificado de qualidade: ficaram famosos os utensílios de ferro de Toledo, os panos da Flandres, os couros árabes de Córdova, as tapeçarias de Arrás, os vinhos franceses. E os produtos do extremo oriente (a seda, o jade, a porcelana) chegavam e eram valorizados nas repúblicas italianas que prosperaram com esse comércio. Predomina, nessa altura, o comércio itinerante. As feiras medievais que proliferam por toda a Europa eram o lugar de encontro entre mercadores e compradores. Os judeus afirmam a sua capacidade de comerciar e empreender e assumem a liderança nos negócios. Surgem novos meios de pagamento e a atividade bancária, iniciada em Itália, contribui para impulsionar o comércio. Começaram a procurar-se produtos cada vez mais longinquamente, no oriente e nas profundezas do deserto, produtos como o açúcar, trazido pelos cruzados, o esmalte e o marfim. A rota da seda foi o primeiro elo de ligação entre a civilização do ocidente e o Império do Meio. E serviu para trazer para a Europa a pólvora, a tecnologia do papel e as especiarias. As descobertas iniciadas no final do século XV pelos portugueses foram desencadeadas e impulsionadas pelas trocas comerciais e marcam o início da globalização. As novas rotas que circundavam África e chegavam ao Novo Mundo trouxeram um novo impulso ao comércio de produtos, tais como as especiarias, o ouro, as madeiras exóticas, o açúcar, o algodão, o cacau, óleos, marfim e escravos. Mas foi no final do século XVIII que a invenção da máquina a vapor, alimentada a carvão, deu lugar à Revolução Industrial, a qual viria a revolucionar a economia. Já no século XIX, surgem o comboio e o navio a vapor, que provocam as grandes migrações de europeus para as Américas e para África. A produção fabril em massa, a redução dos custos de produção e os excedentes da era industrial estiveram na base de uma atividade nova que floresceu e atingiu o seu apogeu no pós guerra: o marketing. O marketing transformou o cidadão, nascido na revolução francesa, em consumidor, que passou a ser o personagem central da nova economia. A revolução Industrial A viragem do século XVIII para o século XIX é um marco na história da Civilização. É o desabrochar das ideias, trazidas primeiro pela Renascença, depois pelos Enciclopedistas e pelos Iluministas, que se sucedem ao obscurantismo e à intolerância religiosa da Idade Média. O pensamento científico sobrepõe-se às crenças do antigo regime e abre novos horizontes à mente humana. A Revolução Francesa, a independência dos Estados Unidos, o progresso científico, são as portas de entrada num mundo novo onde se afirmam os princípios da Igualdade, da Liberdade e dos Direitos do Homem. Por sua vez, a Revolução Industrial, ocorrida nessa altura, muito contribui para essa mudança e ajuda a criar as condições para a sua consolidação. O fator determinante foi a descoberta das máquinas que funcionavam pela força motriz da água ou a vapor e que vieram substituir o trabalho braçal e o trabalho animal. Foi na indústria têxtil, com a mecanização da fiação e da tecelagem, que o seu efeito mais se fez sentir. A Inglaterra liderou a Revolução Industrial, em parte pela importância das suas minas de carvão. E, apesar de perder as colónias da América, veio, por essa razão, a constituir um império onde nunca se punha o Sol, o maior conhecido depois do Império Romano. As fábricas erguem-se por toda a parte no mundo ocidental que, deste modo, assume a liderança económica sobre vastas regiões do globo, nas quais uma boa parte da população ainda vive ainda como se vivia dez mil anos antes na Europa. No Extremo Oriente, uma civilização milenar, a China, estava adormecida pelo ópio que os ingleses traficavam a partir da Índia e deixou passar a revolução industrial ao lado. Nos Estados Unidos, foi a capacidade industrial dos estados do norte que deu à União as condições e o armamento para a vitória sobre a Confederação dos estados sulistas e que resultou na abolição da escravatura. Assente nos princípios da igualdade e da democracia, a jovem nação prepara-se para liderar o mundo nos séculos que se irão seguir. Com a máquina a vapor aplicada à tração, surge o comboio que vence distâncias em tempos até aí inimagináveis e secundariza a milenar importância do cavalo. No início do século XX, o petróleo começa a substituir o carvão e aparece o automóvel e o motor de explosão. A decisão de Churchill, em 1914, de adotar o petróleo como combustível nos navios da Royal Navy, permitiu à Inglaterra ganhar uma vantagem decisiva no mar. A importância do petróleo e a descoberta de imensas jazidas no Médio Oriente foi uma das sementes para os dois conflitos que grassaram na Europa e no Mundo durante a primeira metade do século passado. O século XX inicia-se sob a égide da exposição de Paris. A Europa é ainda o centro do mundo. Existe uma crença ilimitada na capacidade do homem e da ciência de assegurar o progresso sem fim. A par da adoção de novas formas de energia, a revolução tecnológica constitui outro fator de progresso. A eletricidade faz parte desta revolução tecnológica: surge o telégrafo, o telefone, o rádio, a televisão, e a imprensa industrializa-se com as impressoras mecânicas e transforma-se num meio de massas. A produção em série permite disponibilizar, a preços baixos, produtos até então apenas acessíveis às classes mais altas e inicia-se um tempo de grande prosperidade. Em 1800, a Humanidade tinha mil milhões de pessoas, menos do que a atual população da China. Mas, contrariando as previsões de Malthus, tudo estava prestes a mudar: nos 200 anos seguintes a população Mundial vai multiplicar por seis. A ordem económica inspira-se nas ideias de Adam Smith. O capital, a fábrica e o proletário estão na origem de tensões e conflitos de classe que conduzem à revolução russa e à ascensão das ideologias comunistas. As duas guerras da primeira metade do século são ajustamentos iniciados na Europa na busca da liderança. Com o desfecho da Segunda Grande Guerra vai despontar a idade de Ouro e estabelecer-se definitivamente a Sociedade dos Consumidores, que viria atingir o seu esplendor na segunda metade do século XX. Ao mesmo tempo, a economia começava a crescer a um ritmo frenético e poucos se apercebiam que poderia haver limites a esse crescimento. Nos anos da Idade do Ouro, a energia e a tecnologia sobrepõem-se ao capital e ao trabalho como fatores de produção. A velha ordem fica subvertida e os ideais comunistas sofrem um grande abalo. O capitalismo conduz à Globalização e os economistas julgam que dominam a ciência económica e acreditam que podem assegurar o crescimento ilimitado... O consumo nasce nos EUA Nos "loucos anos 20" do século passado, enquanto a Europa se ocupava da reconstrução das ruínas da Primeira Guerra, assistiu-se nos Estados Unidos a um primeiro ensaio de uma euforia consumista. Foi a época louca do cinema, do jazz, do charleston, do fox trot, do desporto e das corridas de automóveis. O Ford T generalizou-se e no final da década havia, nos Estados Unidos, seis milhões de automóveis. A eletricidade começava a entrar nos lares americanos através da iluminação, dos frigoríficos e outros eletrodomésticos. O crescimento parecia ilimitado, o acesso ao crédito era fácil e mesmo estimulado. Naqueles anos, a produção industrial nos EUA representava 44% do total mundial. A mulher, libertada das lides da casa, ganha um novo estatuto, luta pelos seus direitos, muda de hábitos, altera a forma de se vestir e de se arranjar. A febre da prosperidade "ao virar da esquina", como tinha prometido na sua campanha eleitoral o presidente Hoover, que tomou posse no início de 1929, chegou a Wall Street e, em consequência disso, o índice bolsista Dow Jones multiplicou o seu valor por quatro entre 1920 e 1929. Neste assomo de prosperidade, já está omnipresente o fator energia: a eletricidade nos lares e o petróleo nos automóveis alteram hábitos milenares. O crescimento da economia e do Dow Jones torna-se exponencial. O crédito acompanha esse crescimento. Forma-se uma bolha financeira que mais tarde ou mais cedo teria de rebentar. E isso veio a acontecer, subitamente, em outubro de 1929, com o crash bolsista que provocaria uma longa recessão económica associada a alto desemprego e falências de empresas e bancos. Recessão que rapidamente se espalhou à Europa. O new deal inspirado nas ideias de Keynes e a animação económica trazida pela indústria do armamento levaram a uma recuperação da economia e do emprego. Mas a longa recessão teve consequências políticas em todo o mundo: na Alemanha, onde, no início da década, existe uma inflação galopante, os capitais americanos são repatriados e o orgulho nacional está ferido pelos acordos de Versailles, aparece o nacional-socialismo; na Itália surge o fascismo; o Japão, já industrializado, necessita de expandir o seu território para procurar novas fontes de energia e matérias-primas e arma-se para a guerra. Estas alterações criam tensões que estiveram na origem de um conflito generalizado que fez milhões de mortos e só terminou em 1945. Com final da Segunda Guerra inicia-se um período de grande crescimento económico. Verificam-se alterações profundas nos equilíbrios mundiais, a liderança da América afirma-se, emerge a URSS, instala-se a guerra fria, As potências europeias, por processos dolorosos, desvinculam-se das suas antigas colónias e protetorados na Ásia, na Oceânia e em África. Novos países como a Índia, a Indonésia, a Argélia, ascendem à independência e passam a ter um lugar de destaque na cena internacional. A China, liderada por Mao Tsé-Tung, inicia um lento processo de afirmação. A sociedade industrial passa a englobar esses novos países, primeiro chamados "subdesenvolvidos", depois designados de "emergentes". A Europa, enfraquecida pelos estragos da guerra e pela perda das colónias fontes de matérias-primas, recupera com o apoio americano do plano Marshall. O entendimento franco-germânico leva à formação da CECA e ao tratado de Roma, que são as bases de uma Europa Unida. A Inglaterra, presa à Commonwealth e vinculada à América, só mais tarde irá aderir à CE. A Organização das Nações Unidas, criada em 1945, e a União Europeia são elementos centrais de uma nova ordem política. A partir dos anos 50 entra-se definitivamente na sociedade de consumo, uma reedição mais alargada dos anos 20 americanos. O apogeu é atingido no final da década de 80 com a queda do muro de Berlim e o fim da guerra fria. A conjugação dos fatores tecnológico e energético permite desenvolver novos produtos mais sofisticados e com custos mais baixos. A emergência das classes médias e a abertura de novos mercados leva à Era do Marketing, uma verdadeira Idade de Ouro da civilização. Na sociedade de consumo, o consumidor é elevado à categoria de Rei. O consumo é o motor da nova economia. Já não se cuida de vender o que se produz e passa-se a produzir o que se vende. Nas empresas a direção de marketing sobrepõe-se à direção de produção passando a ser o núcleo central da organização empresarial. Afirmam-se as empresas multinacionais, a comunicação rompe as fronteiras e torna-se universal. A era do Marketing sucede à era Industrial e vai produzir a Globalização. A Era do Marketing Na Era do Marketing toda a economia se centra no consumidor. Na contabilização dos ativos das empresas, as marcas passam a ter mais valor do que as fábricas. A concorrência aumenta e, por vezes, assume proporções de guerra sem quartel. O objetivo dos fabricantes é ganhar a preferência dos consumidores para as suas marcas. A comunicação da empresa centra-se na promoção da "imagem de marca" e nos "valores" a ela associados, pois são eles que ajudam a vender os produtos. Com a produção em massa, os fabricantes ficam mais afastados dos consumidores dos seus produtos. Perde-se a antiga relação, próxima e direta, que existia entre o artesão e o seu cliente. O fabricante falava com o cliente e sabia de imediato a sua reação, se ficava satisfeito ou não, se o preço era justo, se a qualidade do produto era boa. Entre eles, o artesão e o cliente, interpõem-se agora os agentes comerciais e o dono da fábrica necessita de restabelecer aquela antiga relação. Por um lado, "falar" com os seus consumidores, e, por outro lado, conhecer as suas reações, os seus gostos, as suas sugestões. Isto está na base de duas novas pujantes indústrias que emergiram na segunda metade do século XX: a publicidade, para comunicar as mensagens, e os sistemas de informações comerciais (dos quais fazem parte os estudos de mercado), para conhecer os comportamentos, atitudes e opiniões dos consumidores. A difusão dos meios de massas, primeiro a Imprensa, depois a Rádio e, por fim, a Televisão, abre caminho a novas formas de comunicar. Prospera a publicidade que se apoia num processo que envolve três componentes: o alvo, o meio e a mensagem. O canadiano M. McLuhan destaca o valor primordial do meio e cunha a expressão "o meio é a mensagem". Esta é a época de ouro dos criativos como David Ogilvy, Bill Bernbach nos Estados Unidos, Jacques Séguéla e os irmãos Charles and Maurice Saatchi, respetivamente, em França e na Inglaterra. Constroem-se grandes empresas associadas a estes homens, verdadeiros artistas da criação de marcas. A agência de publicidade é o núcleo de um mercado que movimenta milhares de pessoas e milhares de milhões de dólares em todo o mundo industrializado. A importância dos meios e os elevados investimentos que lhe são atribuídos levam ao aparecimento nas últimas décadas da agência especializada no planeamento de meios (mediaplanning), isto é, na escolha dos meios e suportes mais adequados à veiculação das mensagens. Estas agências passam a ter um papel charneira no negócio. Concentram-se em grandes grupos e assumem um papel à escala planetária. Nas empresas, ganham importância os sistemas de informação sobre os produtos e sobre os hábitos de consumo. Prospera uma nova indústria, os estudos de mercado. Nos anos 60 do século passado, a Nielsen surge nos Estados Unidos e cria um sistema de informações sobre as vendas de produtos na distribuição. Conceitos como quota de mercado (market share), ruturas e pressão de stocks, taxas de distribuição, são os elementos chave da atividade comercial das empresas. Aparecem os painéis de consumidores e os estudos de audiência de meios. A sofisticação aumenta, fazem-se estudos qualitativos recorrendo a técnicas da psicanálise para perceber as motivações mais profundas dos consumidores, aparece o neuromarketing, procurando as causas e a explicação do consumo e da escolha das marcas na fisiologia cerebral. O Marketing, como já referi, tornou-se no departamento central das empresas. A sua missão pode, de uma forma simples, definir-se como a ciência que permite vender o produto certo, ao consumidor certo ao preço certo (que deve ser o mais elevado possível!). O conceito de "produto" evolui. Deixa de ser uma mera comodidade para adquirir uma personalidade própria que lhe é conferida pelo seu posicionamento. E isso consiste num refinamento na escolha das marcas, na criação de embalagens apelativas e funcionais, na segmentação dos consumidores, na atribuição de "vantagens" psicológicas diferentes das funções primárias do produto, nas promoções, etc... O distribuidor passa a desempenhar um papel importante. A mercearia tradicional dá lugar ao supermercado e ao autoserviço, percursor das modernas grandes superfícies. O carrinho de compras é o novo ícone da dona de casa. A moderna distribuição torna-se num negócio florescente. O objetivo é incentivar mais e mais o consumo e isso é feito com recurso ao "merchandising" que orienta o consumidor dentro da loja, obrigando-o a um longo caminho para chegar aos produtos essenciais (frescos, leite, etc...), que coloca estrategicamente, na prateleira os produtos mais rentáveis à altura dos olhos da dona de casa e que chega a espalhar aroma de pão fresco na zona da padaria que tem o efeito de provocar a compra por impulso. A moderna distribuição destrói o tradicional comércio de bairro e as "novas mercearias" tomam consciência do seu poder, impõem regras aos produtores e criam as suas próprias marcas (as marcas brancas). Todo este processo conduz à concentração de negócios em todas as vertentes: na produção, na distribuição, na publicidade. Deixa de haver fronteiras para as grandes marcas, a General Foods, a CocaCola, a Nestlé, nos sectores de alimentação e bebidas, a Unilever e Procter, nos sectores de higiene e limpeza, são exemplos conhecidos. Mas a Era do Marketing está ameaçada e a crise que se espalhou pelo mundo parece mostrar isso mesmo. O consumidor na sociedade do futuro A sociedade do futuro vai ser muito diferente daquela a que assistimos nos últimos 60 anos. O aumento populacional, por um lado, e, por outro, a escassez de recursos como a água, o solo arável e certas matérias-primas, mas sobretudo a energia, vão ser fatores fortemente condicionantes da economia que irá suceder ao reinado do consumidor. A Era do Marketing foi o resultado da disponibilidade de uma enorme quantidade de energia abundante e barata, a chamada energia fóssil: carvão, petróleo e gás natural. Foi esta energia a responsável pela urbanização, pelo aumento da mobilidade e pela chamada revolução verde na agricultura, mecanizada e à base de fertilizantes, que permitiu alimentar milhares de milhões de pessoas. E que criou o conforto do mundo moderno, uma verdadeira Idade de Ouro da civilização. Os problemas ambientais e as suas consequências constituem uma outra forte condicionante da economia, pela acumulação de resíduos poluentes, pela contaminação de águas e solos e pelas previsíveis alterações climáticas provocadas pelos gases de efeito de estufa. Ora, o nosso sistema económico convive mal com estes condicionamentos e convive ainda pior com a ausência de crescimento que eles vão, forçosamente, provocar. Porque a globalização (o comércio livre, a livre circulação de pessoas e capitais e a industrialização acelerada dos países emergentes) e o desenvolvimento tecnológico, onde se colocam todas as esperanças, só por si, podem não ser suficientes para contrariar os referidos fatores condicionantes e sustentar o tão desejado e necessário crescimento. Também a "complexidade" do mundo moderno cria várias dependências nas redes de abastecimento, de comunicações, redes sanitárias, etc, e aumenta o risco de que uma rutura em um único nó de uma dessas redes se possa propagar por toda a rede de uma forma descontrolada. Ora a complexidade cresce naturalmente com a economia (ela é uma exigência, ao mesmo tempo causa e efeito, desse crescimento), e as redes (que têm de ser mantidas e alimentadas continuamente) tornam-se elas próprias geradoras de complexidade. E pode chegar um momento em que as vantagens de aumentar a complexidade vão ter um valor inferior aos custos que esse aumento exige. Uma tal situação pode ser geradora de colapso e terá sido precisamente isso o que, na opinião de Joseph Tainter, aconteceu no Império Romano e justificou a sua queda. O rendimento disponível das famílias vai continuar a diminuir e isso arrastará ainda mais a queda do consumo. O crescimento económico vai estar condicionado pelos fatores atrás referidos (o aumento populacional, a escassez de recursos e a poluição). Vamos ter de alimentar mais pessoas com menos recursos, vamos ter de racionalizar o uso de certas matérias-primas, racionalizar as embalagens e os gastos de publicidade e promocionais e gerir os desperdícios. E temos de fazer isto num ambiente de prosperidade e não num clima de austeridade, se quisermos evitar conflitos sociais ou conflitos armados. A crise em que vivemos já se manifestou nos domínios do marketing, da publicidade e dos estudos de mercado. Nos últimos anos, a situação começou a mudar de forma significativa e, acredito eu, irreversível. Em Portugal, a diminuição do consumo está a provocar uma forte diminuição de investimentos em publicidade e em estudos de mercado . E não se veem sinais de inversão desta tendência. Estamos enfrentando uma época de profundas mudanças que estão a ocorrer com uma rapidez impressionante e que nos impedem de fazer previsões a médio e longo prazo. O mínimo deslize, o mínimo erro, podem desencadear processos de forte impacto e deixar a economia fora de controlo. A Revolução Francesa fez o cidadão, a Revolução Industrial fez o consumidor. A crise da Era Industrial vai alterar os pressupostos da sociedade de consumo. Não sabemos como será a Era que virá a seguir, nem como será a revolução de onde ela sairá. Mas será que ainda iremos a tempo de fazer uma revolução que dê um novo rumo ao destino da espécie humana? |
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